Economia no piloto automático

Marilia Fontes 05/07/2021 12:13 7 min
Economia no piloto automático

Eu sempre dirigi carro manual. Quando fiz 18 anos, não ganhei um carro (como a maioria dos meus amigos de escola), mas eu podia pegar o carro dos meus pais emprestado, e isso já ajudava muito. Não era fácil aprender a trocar as marchas e subir uma ladeira, mas com a prática fui ficando até bem boa nisso.

Lá pelos meus 23 anos, meu pai finalmente comprou um carro automático por conta de um problema nas mãos. Nossa, quanta diferença! Para quem está acostumado a trocar marcha, um carro automático praticamente anda sozinho. Quando você está na ladeira e quer sair, o carro não desce. É surreal a evolução.

O melhor de tudo foi quando descobrimos o botão de piloto automático. Nossa, eu queria apertar aquele botão em qualquer avenida. Dava o sinal vermelho e eu enxergava 1 quilômetro pela frente, já ia para a velocidade máxima da pista e apertava o piloto automático. Oh sensação boa de não precisar fazer nada para manter a velocidade.

Fico pensando que esse botão de piloto automático seria útil em diversas situações. Colocar o Biel para dormir no carrinho e apertar o piloto automático para ficar dando voltas embaixo do prédio seria maravilhoso. Ou acionar um piloto automático para manter a temperatura da panela constante e não queimar o brigadeiro, já pensou?

O racional do piloto automático é simples: manter uma rotação estável no carro, de forma que a sua velocidade não acelera e nem desacelera. Simples e muito útil.

Não sei se vocês sabem, mas tem um conceito em economia que funciona exatamente como o piloto automático do carro. Muito provavelmente vocês já ouviram falar desse conceito, mas talvez não saibam exatamente o que é. O nome dele é JURO NEUTRO.

O juro neutro é um nível de taxa de juros que, quando chegamos a ele, a inflação não acelera e nem desacelera. Ele é o piloto automático do Banco Central e é essencial no cumprimento da meta de inflação.

Toda economia tem ciclos de crise e de crescimento acelerado. A grande depressão de 1929 foi uma crise tão severa que levou o desemprego americano para 25 por cento. As consequências sociais, como a fome, eram tão assustadoras que o governo começou a pensar em formas de suavizar os ciclos econômicos, tornando as crises menos severas e as épocas de superaquecimento mais controladas.

Com isso, surgiu o Banco Central unificado da forma que conhecemos hoje, e os mecanismos de política monetária se fortaleceram. Hoje, temos um regime no Brasil e na maioria do resto do mundo que funciona com metas de inflação.

As instituições governamentais estipulam uma meta para a inflação, que no Brasil é decidida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN). Cabe ao Banco Central desses países alterar a taxa de juros para que a inflação caminhe para a meta. Em condições normais de temperatura e pressão, o JURO NEUTRO mantém a inflação na meta, como um piloto automático. No entanto, as economias têm ciclos e, quando esses ciclos mudam, os Banco Centrais têm que reagir.

Imagine que hoje estoure uma bolha imobiliária no mundo, como em 2008, e cause uma grande crise. O consumo das famílias cai, assim como a receita das empresas e, em seguida, as empresas demitem funcionários, que ficam sem os salários e param novamente de consumir, entrando em um grande círculo vicioso. Essa queda na demanda faz com que os preços caiam também e a inflação vá para baixo da meta estipulada.

Nesse caso, o Banco Central deve atuar reduzindo a taxa de juros para baixo do juro neutro. A redução dos juros leva a vários caminhos, dentre eles:

  1. Barateia o crédito

O crédito mais barato faz com que mais pessoas peguem empréstimos, portanto o consumo aumenta.

2.   Desvaloriza a moeda

Juros mais baixos em relação a outros países do mundo fazem com que investimentos saiam em busca de retornos maiores e desvalorizem a moeda. A desvalorização da moeda, por sua vez, aumenta o preço dos produtos importados e estimula o consumo de produtos nacionais, melhorando a atividade.

3.   Aumenta o preço dos ativos

Ativos são precificados pelos fluxos de retorno que eles geram, trazidos a valor presente pela taxa de juros. Quando os juros caem, o preço dos ativos se valoriza.

4.   Reduz a remuneração do investidor

Quando a taxa de juros é menor, o investidor terá um estímulo a menos para poupar e um estímulo a mais para consumir.

5.   Expectativas

Sabendo que os juros mais baixos vão estimular a economia, os agentes já ficam mais seguros na volta da atividade e tomam decisões mais confiantes.

Ou seja, dada uma crise que reduz a demanda e leva a inflação para baixo da meta, o Banco Central age com a política monetária, reduzindo a taxa Selic para baixo do neutro, estimulando assim a demanda agregada e gerando pressões altistas para a inflação. Quanto mais os juros caem, maior é a pressão altista da inflação e mais rápido ela tende a voltar para a meta.

Mas chega uma hora que a atividade se recupera e a inflação finalmente converge para a meta. Quando isso acontece, o Banco Central tem que subir de novo os juros e voltar a taxa Selic para o nível NEUTRO.

Se ele não levar a taxa para o neutro, o estímulo vai seguir sendo dado, assim como a pressão inflacionária vai passar da meta e seguir subindo até uma hiperinflação. Por conta disso, o BC cai a taxa de juros e depois tem que subir. Os juros sempre vão oscilar em torno de um nível neutro.

Se a atividade estiver muito aquecida por conta de um superciclo de commodities, por exemplo, como aconteceu de 2003 a 2007, o Banco Central tem que subir a taxa de juros acima do neutro, esfriar a demanda agregada (pelos mesmos mecanismos de transmissão) e jogar a inflação de volta para a meta. Quando a inflação voltar, ele deve voltar a taxa Selic para o neutro.

O nível neutro é tipo o piloto automático do carro. Se a velocidade máxima da pista é 100 km/h, eu chego lá e posso apertar o botão. Se eu estiver andando muito abaixo disso, vou ter que acelerar e depois apertar o botão. Se eu estiver muito acima disso, vou ter que frear até chegar nos 100.

A mesma coisa vale para a meta de inflação. Se eu estiver muito acima da meta, vou ter que esfriar a economia subindo a Selic, e depois posso voltar para a taxa neutra. Se eu estiver muito abaixo da meta de inflação, vou ter que acelerar a economia reduzindo a Selic, e depois posso voltar para o neutro.

A taxa neutra pode mudar de tempos em tempos. Depende de vários fatores como o nível de gastos de um governo, produtividade, taxa de natalidade etc. Estima-se que, no Brasil, a taxa neutra esteja em torno de 6,5 por cento.

Segundo a última ata do Banco Central, essa alta da Selic que estamos tendo é exatamente para voltar a Selic para o juro neutro, porque a inflação está começando a parecer que vai ficar acima da meta.

Se ele chegar lá, vai poder apertar o botão do piloto automático! O problema é que, ao contrário de uma estrada, a velocidade de um país sempre está mudando, e o Banco Central fica nessa de subir e cair a Selic o tempo todo.

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